A cada saidinha
Não! Não é aquela “saidinha” em que parte da bandidagem se aproveita para cometer mais crimes! Vou falar daquelas pequenas idas e vindas que fazemos cotidianamente: ir à padaria, ao sacolão, ao depósito, à farmácia etc.
Uma ida matinal à padaria me fez ter um encontro com um senhor, que nunca tinha visto antes, o qual mais parecia ter sido levado por sua cachorrinha vira-lata para um passeio, que o contrário. Mas eu quero falar é da atitude dele, em relação ao nosso encontro – ainda à distância – no mesmo passeio, com um poste de entremeio. Antes do poste, ele parou segurando a guia da sua vira-lata e me disse numa voz bem audível: “Pode passar! Ela é muito mansa!”. Eu olhei para ele, agradeci com um meio sorriso, apenas, mas não confiei nem um pouco nos dentes à mostra na boca daquela fêmea, que nitidamente protegia seu tutor. Dei a volta, saindo do passeio e caminhando pelo asfalto, embora de costas para o fluxo do trânsito, acreditando que qualquer carro que fosse circular por ali teria um condutor consciente de que aquela blusa verde neon trazia dentro dela uma senhora nada mansa!
Seguindo, fui até a padaria, pão quentinho saindo da fornada justo quando eu ia me servir. Comprei quantidade farta para as três pessoas que tomariam o café matinal daquele dia. Da broa comprei um quarto daquilo que era ofertado na bancada. Eu comeria desse um quarto também. Um tal de “mineiríssimo”, que é quase um pão doce assado e com bastante queijo dentro, também não escapou ao meu olhar atento e à minha gula matinal.
Depois que saí da padaria com a sacola bem abastecida, atravessei a rua e me deparei com uma cena que me fez rir internamente – já que não sou santa! –; aliás, rir não! Gargalhar! Caminhava no passeio que fica defronte a um pequeno depósito do meu bairro, daqueles bem típicos, ou seja, cheio de tudo quanto é tralha que se possa imaginar. Esse depósito tem duas portas na frente da loja. Daí que justo na hora em que eu passava, saiu de uma delas e se dirigiu para a porta contígua, uma senhora bem idosa. Daquelas que eu, mesmo já sendo da terceira idade e necessitada de ajuda em várias coisas, penso logo em ajudar. Essa senhorinha estava com uma vassoura de piaçaba nas mãos e tinha os cabelos desgrenhados como se não os penteasse há vários dias; sobre o corpo magro, um vestido preto e comprido. Não bastasse, ostentava uma pinta enorme no nariz.
Pois é!… Não teve mesmo jeito! Sei que até pode ser estereótipo, mas eu associei essa senhora com a vassoura nas mãos àquelas bruxas dos desenhos animados. Na minha cabeça desfilou um filme todinho. Como era antes das oito da manhã (ainda estou com a reforma a todo vapor e o pedreiro chega bem cedinho!), a frase que veio à minha mente e meus lábios quase pronunciaram foi: “Vai sair pra um voo logo cedo?”. Graças a Deus a minha mãe me deu uma educação rígida e sempre me dizia para eu respeitar aos mais velhos! Senão… Eu poderia ter levado uma tremenda vassourada!
De outra feita, numa saidinha não a pé, mas de carro, fui levar o último hóspede – aquele responsável pelo meu susto que me valeu o texto “Coração forte” – para o quarto que ele havia alugado a um minuto de uma das portarias da instituição onde ele estuda Engenharia. Deixei-o bem na porta do imóvel, descarregando as caixas e, devido ao sol escaldante, fiquei no passeio oposto, sob a sombra agradável de uma pequena, mas robusta árvore. Pouco mais à frente do meu carro, igualmente estacionado, um veículo Palio em cujo interior e assentado ao volante estava um senhor mexendo em seu celular, com a janela escancarada.
Eram muitas caixas para serem retiradas do meu carro e eu, observadora do entorno que sou, percebi a aproximação de um desses jovens pedintes que, ao olharmos, temos a nítida sensação de que se acomodou nas ruas, mas que poderia perfeitamente trabalhar em vez de mendigar. Enfim, vi que ele se aproximava de mim e que me pediria algo, o que de fato se concretizou. Falei a verdade para ele: “Não tenho nem um tostão na bolsa!”. Ele não se fez de rogado e se dirigiu a passos seguros para a janela do carro onde estava o senhor ainda mexendo no celular. Imaginei que poderia ser a última vez que o dono do aparelho consultava o seu “brinquedinho”, mas me enganei. O jovem fez o mesmo pedido que havia dirigido a mim instantes antes; apenas isso.
O senhor abaixou o celular imediatamente e olhou para o rapaz bem próximo à janela do carro e respondeu com uma frase “porto-ítalo-hispânica” com aproximadamente essas palavras”: “Yo sono extraniero!”. E um sotaque mineiro bem carregado, que pude facilmente compreender. Depois eu confirmei a placa de Belo Horizonte no veículo desse senhor. O rapaz não se fez de rogado! Falou que receberia dólar ou euro. O homem contestou falando do mesmo jeito engraçado, esquisito e disfarçado: “Non tengo plata, dinaro!”, enquanto fazia o gesto tão nosso conhecido de esfregar os dedos polegar e indicador.
O rapaz ficou curioso e quis saber de onde o homem era, qual a origem daquele homem de fala tão diferente. Daí que o homem respondeu: “Yo sono italiano!”. Percebi que havia ali uma farsa, mas queria ver até aonde iria. O rapaz desistiu e caminhou para o cruzamento que estava próximo e rapidamente sumiu de minha visão.
Querendo saber mais daquele imbróglio, eu me dirigi ao motorista do Palio, que estava ainda no mesmo lugar. Eu o abordei, falando em italiano com ele. Já me encontro em um nível intermediário de conversação nessa língua e quis encetar uma conversa com ele e, qual não foi a minha surpresa ao ver que ele até que falava italiano, mas não quis seguir conversando comigo e, para terminar com a minha prosa, ele comparou o italiano com o russo, alegando que este último é mais fácil que o italiano, ao que contestei prontamente, informando a ele que estudo russo desde janeiro deste ano, sou uma aluna dedicada, mas como é uma língua distante das línguas românicas, representa uma maior dificuldade para nós, brasileiros, quanto ao aprendizado. Ele percebeu que não teria muitos argumentos mais em face da minha contestação e ligou o carro e partiu sem sequer se despedir de mim, fosse em que língua fosse!
O mais engraçado desta última situação mesmo foi quando eu comentei com amigos que estavam me visitando aqui em casa, por ocasião da comemoração do meu natalício, e um deles interveio dizendo assim: “Achei que você fosse traduzir para o rapaz o que o homem estava falando, ajudando-o a ganhar algum dinheiro da vítima ‘estrangeira’”. Pode? Risos!
Resumindo: ficar em casa é bom, produtivo, mas sair também pode ser bem divertido algumas vezes!
MoBa NePe Zinid – 22 nov. 2024.
As suas saídas são muito produtivas e divertidas! Ainda bem que o cachorrinho não te mordeu e que o “estrangeiro” manteve seu celular rsrsrs Adorei o texto!
Oi Élida,
obrigada por visitar este espaço de reflexão e com palavras que encontram eco em seu comentário!
A sua leitura do meu texto é sempre uma alegria pra mim!
Envio-lhe boas energias!
Adorei! E concordo plenamente: ficar em casa é bom, produtivo, mas sair também pode ser bem divertido algumas vezes!
Oi Cristina,
que alegria ter você passando por aqui!
Obrigada por sua leitura e comentário!
Beijo na filha e na netinha!
Envio-lhes boas energias!
Oi, Mônica, querida! Gostoso demais o seu texto!!! Leiamos sempre!
Querido amigo e poeta Evaldo,
um privilégio tê-lo como leitor de minhas singelas palavras!
Muito obrigada pelo elogio! Vindo de você é ganhar um prêmio!
Beijo no coração!
Professora Monica,
que texto divertido e gostoso de ler. Amei saber sobre cada um dos causos engraçados relatados na crônica. A parte do café da manhã, mais do que nunca, me atiçou muito em pegar um voo imediato de João Pessoa para BH.
Um beijo e um grande abraço muito afetuoso 🥰